sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Resolvi começar a seção de poesia com o meu escritor favorito: Guimarães Rosa

Guimarães Rosa não ficou conhecido por sua poesia, mas pela prosa inovadora e personalíssima de livros como Grande Sertão:Veredas. Nas palavras do digno Manuel Bandeira, apesar de Rosa ter escrito poesia das mais belas, ele estava mais para bissexto contemporâneo quando o assunto era poesia propriamente dita e não prosa. Para quem ficou perdido com o que falei, é melhor não correr para pegar o Aurélio e procurar a expressão. A designação foi dada por poetas peso pesados como Vinícius de Moraes (setembro de 1942 na revista argentina Sur) para descrever um escritor esporádico de qualidade, daqueles que produzem dez poemas em toda a vida. E Guimarães Rosa se enquadra nessa categoria quando o assunto é poesia. Poucos sabem que ele estreou nas letras com Magma (1936), um livro de versos. Em ’61, apareceram no Globo, na crônica semanal assinada por ele alguns poemas de um certo Soares Gulamar, mas esse tal era o anagrama de Guimarães Rosa..... Seguem abaixo algumas poesias de Rosa. (a terceira é a minha predileta…bem, a “Adamubies” também….não dá mesmo para escolher!). Divirtam-se!


Pescaria

O peixe no anzol
É kierkegaardiano.
(O pescador não sabe,
Só está ufano.)

O caniço é a tese,
A linha é pesquisa:
O pescador pesca
Em mangas de camisa.

O rio passa,
Por isso é impassível:
O que a água faz
É querer o seu nível.

O pescador ao sol,
O peixe no rio:
Dos dois, ele só

Guarda o sangue frio.

O caniço então
Se sente infeliz:
É o traço de união
Entre dois imbecis.....



Adamubies?


Corpo triste
Alva memória
Tenho fadiga
Não tenho história.

Triste sonho:
Sonhar quero....
Pelo que espero
Tudo abandono.

Corpo triste, triste sono,
Faz frio à beira da cova,
Onde espero a lua nova
Como o cão espera o dono.


Ou……Ou……


A moça atrás da vidraça
Espia o moço paasar.
O moço nem viu a moça,
Ele é de outro lugar.

O que a moça quer ouvir
O moço sabe contar:
Ah, se ele a visse agora,
Bem que havia de parar.

Atrás da vidraça, a moça
Deixa o peito de suspirar.
O moço passou depressa,
Ou a vida vai devagar?


A Ausente Perfeita

Mal refletida em multidão de espelhos,
Traída pela carne e meus olhos,
Pressentida
Uma ou outra vez, quando
Consigo gastar um quanto de minha
Pesada consolação transitória
Poderás ser:
A ave
A água
A alma?



Para quem quiser reler obras-primas, leiam também. Tudo bem, admito, a minha vida de jornalista “pau para toda obra” só me deu tempo para reler dois livros, Grande sertão:veredas e Primeiras Estórias.

Grande sertão:veredas
Manuelzão e Miguilim
No Urubuquaquá, no Pinhém
Noites do sertão
Sagarana
Primeiras Estórias

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